MENSAGEM de Fernando Pessoa- Primeira Parte: BRAZÃO
II -OS CASTELLOS
Sétimo (1)- D. JOÃO O PRIMEIRO
Sétimo (2)- D. PHILIPPA DE LENCASTRE
.Ouça aqui o poema (para estudantes de português) Óleo de Carlos Alberto Santos
D.JOÃO O PRIMEIRO
O homem e a hora são um só
Quando Deus faz e a história é feita.
O mais é carne, cujo pó
A terra espreita.

 

Mestre, sem o saber, do Templo
Que Portugal foi feito ser,
Que houveste a glória e deste o exemplo
De o defender.

 

Teu nome, eleito em sua fama,
É, na ara da nossa alma interna,
A que repelle, eterna chama,
A sombra eterna.
D.PHILIPPA DE LENCASTRE... (ouvir)
Que enigma havia em teu seio
Que só génios concebia?
Que archanjo teus sonhos veio
Vellar, maternos, um dia?

 

Volve a nós teu rosto sério,
Princeza do Santo Gral,
Humano ventre do Império,
Madrinha de Portugal!

Comentários:

D.João o Primeiro: "O homem e a hora são um só, quando Deus faz e a História é feita"- Fernando Pessoa exprime de novo a ideia de que o destino é traçado por Deus e rege inexoravelmente a História. Quando uma nação atinge uma encruzilhada (como Portugal em 1383) é a hora e os escolhidos executam os actos determinados. O homem é o papel que desempenhou, este é o requerido pela ocasião (pela hora), a ocasião é determinada pelo Destino, o Destino foi traçado por Deus... (simples, não?). Conhecemos D.João I porque teve a sua hora; sem ela teria sido um obscuro mestre de uma ordem militar obscura. Sem a hora não teria havido o homem...

"na ara da nossa alma interna"- no altar do nosso espírito nacional.

"repele a sombra eterna"- repele o olvido, que seria o destino de Portugal se perdesse a sua identidade como nação.

D.Filipa de Lencastre: "Que enigma havia em teu seio que só génios concebia"- referência à chamada "ínclita geração" dos filhos de D.Filipa e D.João I.

"Volve a nós teu rosto sério"- vira o teu rosto (sisudo...) e olha para nós; lembra-te de Portugal; reza por nós!

"Princesa do Santo Gral"- referência ao Graal procurado pelos cavaleiros medievais das lendas da Távola Redonda. Existem várias versões sobre o que seria, mas a mais comum refere-o como a taça de onde Cristo bebera na Última Ceia e/ou que teria recolhido o seu sangue na Cruz. A referência deve ser interpretada como "Princesa mística" porque fadada por Deus para ser mãe dos principes da ínclita geração e muito particularmente do Infante D.Henrique; ou "Princesa da grandeza (futura) de Portugal" (o Graal era suposto trazer felicidade à Terra).

..Ouça aqui o poema (para estudantes de português) .
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Lisboa, Portugal. Ago 31, 2003; revisto Mar 08, 2004
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João Manuel Mimoso
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NOTAS: Sobre o Graal ver também os comentários a "O Desejado".

English version

An introduction to the poems: I(...)

King Joao, the First

The man and the hour are one
When God makes and history is made.
The rest is flesh, whose dust
The earth awaits.

 

Master, unwitting, of the Temple
That Portugal was made to be,
You won the glory and gave the example
Of defending it.

 

Your name, elected for its fame,
Is, on the sacrificial altar of our inner soul,
The eternal flame that wards off
The eternal shadow.

 

Philippa of Lancaster

What enigma held your bosom
That geniuses alone did conceive?
What archangel came to watch
Over your maternal dreams, one day?

 

Turn to us your austere face,
Princess of the Holy Grail,
Human womb of the Empire,
Godmother of Portugal!